sexta-feira, 30 de julho de 2010

Noite

Óleo sobre tela; 41 X 33 Cm.

quarta-feira, 28 de julho de 2010

Barcos

Óleo sobre tela; 27 X 41 Cm.



segunda-feira, 12 de julho de 2010

Fragmento conto: No Rio de Janeiro

Céu azul profundo, claro. Distantes, pequenas nuvens brancas permanecem imóveis, indiferentes. Sol brilhante, quente. O sol observa do fundo do céu azul, impassível, como sempre é o sol do Rio de Janeiro. No alto um ponto escuro, uma pipa que boia solitária, um barco a deriva no oceano imenso; ainda em paz, como as nuvens.


Aqui na terra como não no céu, a cidade pulsa violenta, bombeando vida e morte em suas artérias. Praias, calçadões, arranha-céus, avenidas e rodovias, morros e favelas constituem a anatomia do Rio. Anatomia que mescla e se confunde constantemente.


“Sorvete de coco, aquela lá.”


“Espuma de cerveja, parece mais.”


“É mermo aí, branquinha, espuma de cerveja lá no céu.”


“É Deus tomando uma gelada tá ligado, aí a espuma que cai do copo dele forma as nuves.”


“Viajou aí, só falta dizer que vai chover cerveja também...”


“Caralhoooo!!! Já tô vendo tudo colorido neguinho!”


“Tô falando pra tu arriá logo essa porra. Tá ligado que nós tem que parti pra missão. Porra, tá tranquilão já a parada lá embaixo já e tu ainda tá aí com essa porra...”


“Ih! Qual é neguinho?! Tô dizendo... Tá cedão ainda no bagulho irmão.”


“Cedão porra nenhuma, geral já tá na atividade já cumpadi, só nóis que tá aqui de bobeira no bagulho ainda...”


“Já é já então mané; só mais uma, se eu vuá vuei.”


“Tá tranquilo então, só mais meia hora tá ligado, se não eu vou meter o pé.” Disse o garoto que estava sentado à sombra da caixa d’água. Descalço e sem camisa, vestindo apenas uma bermuda jeans larga, fumando um cigarro e segurando um rádio comunicador de ponto único motorola talk about. Junto dele, no chão, estavam uma mochila, um binóculo de lentes vermelhar e uma pistola calibre 45 cromada.


“E aí parcero, atividade lá embaixo?” Perguntou o outro garoto que estava em pé, também sem camisa; cabelos crespos e pele queimada do sol do Rio, vestindo uma calça jeans da redley e um tênis nike oito molas.


“Tranquilão...” Disse o que estava sentado e agora olhava pela beirada da laje com o binóculo “Tem uns verme ainda lá embaixo ainda tá ligado, na entrada da padaria, duas patana azuzinha só... Mas o caverão já vazou.”


“Caralho aí, tu viu o nem? O tiro arrancou o braço dele porra, sinistro. De 7,62. Foi quere fica trocando com os verme sozinho... Se fudeu. A gente vazou tá ligado, o bagulho ficou doido. Já era...”


“Porra! Sem vento tá foda!” Disse o terceiro garoto, enquanto tentava manter a pipa no alto.”


De cima da laje onde os três garotos estavam, no ponto mais alto da favela do Morro dos Macacos, era possível ter uma visão privilegiada dos milhares de barracos e construções que formavam todo o complexo, assim como de vários outros morros; inclusive de longe dava pra ver até mesmo a favela do Morro de São João; que pertencia a uma das facções rivais, e que os traficantes do Morro dos Macacos estavam em vias de invadir.


A cidade do Rio é dividida por linhas imaginárias, demarcando territórios bem delimitados cujas fronteiras são assinaladas por pichações e grafites das siglas CV, AdA e T.C.P. Iniciais das facções Comando Vermelho, Amigos dos Amigos e Terceiro Comando Puro; que estão em conflito permanente pela disputa do mercado do tráfico, guerreando umas com as outras. Além dessas três, duas outras forças promovem a manutenção da guerra civil que assola a Cidade Maravilhosa. Uma delas é quase tão poderosa quanto às outras três, e também conhecida por suas iniciais: PM. A outra, consideravelmente inferior, controla alguns pequenos territórios, sobrevivendo de fundos provenientes de negócios ilegais e extorsões de moradores e pequenos comerciantes: são conhecidos como “milícias”. Cada rua, cada beco, bairro ou favela pertence não aos moradores, não à cidade, e sim a um desses grupos.


“Porra neguinho, dá linha aí caralho! Alá o pipão que tá subindo...” Disse o que olhava pelo binóculo. “...Maior piaozão do flamengo aí... Arrasta lá.”


“Tem pipaozão certo não irmão. Vô arrastá na mão tá ligado.”


“Arrastá na mão... Aí! Aí! Se liga só na letra...” Disse o garoto do lado, improvisando uma rima de funk “...Se botá pipa no alto eu vô arrastá na mão/ Aqui é o Cerol do bonde dos boladão/ Vô manda um papo reto que aqui a chapa é quente/ Vô cortar os alemão e pode crer que nós não mente./ É o bonde dos boladão, tá ligado meu irmão...”


“Caralhoooo! Mandô neguinho. Tu é foda! Como é que é? Manda aí de novo... Bonde boladão?”


“Aqui é o cerol do bonde dos boladão,/ Só na atividade pra cortá os alemão./ Aqui é o cerol te mandando um papo reto/ Vem de pipa ou de pião que o teu azar é certo...”


“Tu é foda muleque, tu divia gravar essa porra, ou então mandar lá pro MC Sabão. Tá ligado. Ia arruma um dinheiro.”


“Qual é neguinho, vai cortá o pipão do flamengo?”


“Cumpadi, tem flamengo certo aqui não irmão. O bagulho é doido. Tá com peninha dos alemão viadinho?”


“Qual é parcero, tá mês estranhando? Tiro na cara dos alemão.”


“Aí, se liga só que eu vou mandar um batidão também...” Disse o que segurava o binóculo, arriscando também um funk “...Tchum..., tchum, thum, tchá. Tchum... tchum, thum, tchá... Esse é o bonde boladão, passando o cerol/ Se... Se...”


“Caralho... Fudeu. Cala a boca aí que não dá pra tu não otário.”


“Comé que não dá: É o bonde boladão, passando o cerol/...” Insistiu o garoto “... Se você metê a cara... Se você vai... Caralhooo, tá foda mermo; o que que rima com cerol aí?”


“E alah?! Tu é muito buxa muleque!” Os outros debocharam.


“Vô te ensinar otário...” Disse o que estava rimando com sucesso “Tá ligado na minha letra? O Juninho é um mongol/ Não sabe uma palavra que rima com cerol./ Tá ligado na minha letra? O Juninho é um animal/ Só sabe chupar rola, dar o rabo e rimar mal.”


“Iahhhhh. Zuou muleque!” Disse o que soltava a pipa.


“E tu o viadinho? Não tô vendo tu mandar nada... Então se liga: O Fabinho tá dizendo que eu sou um mongol/ Mas na verdade o que ele quer é me dar o furiscól.”


“Aí Fabinho, vai deixar? Eu não deixava não...” Disse novamente o que soltava pipa, querendo incitar a disputa de rimas.


“Cala a boca aí o viadinho! Não tô vendo tu mandar nada mermo não. Alá, tá com medinho de dar linha e os alemão é que tão vindo te arrastar na mão.”


“Caralho, é mermo... E ainda te mandaram tomar no cu.”


“Como é que você sabe?”


“Daqui eu li os lábio do maluco.” Disse o que olhava pelo binóculo em direção ao morro de São João.


“Puxa! Puxa a linha porra! Os cara tão te arrastando...”


O garoto que soltava a pipa começou a puxar a linha com o máximo de velocidade que seus braços magros lhe permitiam. A mão ensanguentada de um corte causado pelo cerol ia deixando a linha vermelha, ao passo que ela se acumulava e embolava sobre a laje...