sábado, 10 de abril de 2010

Fragmento: Capítulo 5 - De como R. se Tornou Sócio em uma Galeria Famosa e Samuel um Crítico Respeitável

Minha relação com R. nunca mais foi a mesma, nunca mais voltou ao que era nos tempos de faculdade, onde éramos companheiros quase que inseparáveis, e R. me ajudava com as garotas, enquanto eu o ajudava nos estudos. Na verdade, nossa relação nunca mais chegou nem perto disso. Agora trabalhávamos juntos, ou, mais exatamente, eu trabalhava para ele. Não é difícil imaginar como algo do tipo poderia acontecer. Eu era bom no que fazia, embora fosse um completo desconhecido; com exceção de alguns artigos, publicava uma coluna semanal em um periódico de pouca circulação, e conseguia o meu sustento lecionando. Ele também era bom no que fazia, um dos melhores em sua área, e, ao contrário de mim, era bastante conceituado. Não hesitei em aceitar a proposta. Claro, havia ainda muitos resquícios da hostilidade anterior, que eram amenizados por pequenas gentilezas e algumas conversas triviais, geralmente como introdução a assuntos de negócios. Negócios. Não existia mais nenhuma amizade, agora eram apenas negócios. Contudo, eram bons, daqueles pelos quais deixamos nosso orgulho de lado.

Eu morava em um pequeno apartamento no centro, e minhas atividades se resumiam a alguns minutos de exercícios diários, uma alimentação geralmente frugal, a rotina da universidade onde lecionava e os poucos artigos críticos que escrevia, além da coluna semanal no já mencionado periódico. No mais, meu tempo era dedicado as leituras e ao romance no qual vinha trabalhando. Morava sozinho, saia pouco de casa. Não tinha parentes e quase nenhuma amizade. Um perfeito anônimo.

Tinham se passado alguns anos de quando deixei a faculdade, após concluir o curso de crítica, uns dois ou três anos, e essa rotina já estava bem estabelecida. Contudo, em uma dessas tardes, após voltar da universidade onde lecionava, liguei a secretária como de costume, e qual não foi a surpresa ao ouvir o som daquela voz: “Samuel, tudo bem? Tentei entrar em contato com você mas só agora consegui o seu numero. Quem está falando é R., você deve se lembrar de mim. Escuta, tenho uma proposta de negócios que deve te interessar. Você continua escrevendo para aquele jornal? Se quiser conversar e saber do que se trata, me liga; o número é 843...”

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